segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Sarcoma Induzido por Vacina nos Gatos

"Doutor é verdade que é perigoso dar vacina nos gatos, e que eles podem desenvolver câncer?"

O sarcoma induzido por vacina é um câncer do tecido conjuntivo que ocorre onde a vacina foi previamente administrada. Trata-se de uma consequência rara da vacinação nos gatos, e que não ocorre nos cães. Desde sua descoberta, no final da década de 80, foram desenvolvidas muitas vacinas novas para felinos, e a vacinação dos gatos tornou-se mais comum do que era antes. O objetivo dessas modificações era melhorar a saúdes desses animais. Ao mesmo tempo, entretanto, os patologistas veterinários notaram mais sarcomas nos locais onde as vacinas geralmente são administradas nos gatos: entre ombros, nas patas traseiras e sobre o dorso.

Diversos estudos indicam que a maioria dos gatos não contrai esse tipo de câncer a partir da vacinação. Apenas 1 em 10000 desenvolvem tumor no local da vacinação. Sabemos que os tumores ocorrem com maior frequência em resposta à vacina da raiva e da leucemia felina, mas que a marca da vacina não faz diferença. O risco foi de duas a três vezes maior quando duas ou mais vacinas foram administradas no mesmo local.

A causa exata desse problema permanece um mistério. Uma vacina normalmente funciona provocando irritação ou inflamação no local da aplicação. Uma teoria é que, em raros gatos, as células normais no local da vacinação dividem-se anormalmente e sofrem mutações. Uma célula que acumula muitas mutações se dividirá incontrolavelmente e se transforma em um sarcoma. Obviamente, está é uma explicação muito simplificada do que de fato deve estar acontecendo.

Os tumores podem se desenvolver tão cedo quanto nos primeiros 2 meses após a aplicação, bem como mais tarde, como 3 a 4 anos após a vacinação. Esses podem ser tratados com cirurgias se forem encontrados enquanto ainda são pequenos. A cirurgia deve ser rigorosa, no sentido de remover todo o tumor. Quando o tumor ocorre nos membros, por exemplo, os mesmos devem ser amputados. O sarcoma crescerá após a cirurgia a menos que todo o tumor seja removido, incluindo suas ramificações ao redor da massa.

A radioterapia pode se utilizada antes, caso o tumor seja grande, ou após a cirurgia, como forma preventiva de reincidência. A irritação temporária da pele e a perda de pelo ao redor do local do tumor são comuns. Esse tratamento pode ajudar o gato a viver muitos anos. A quimioterapia pode retrair os sarcomas induzidos por vacina, mas não pode curar este tipo de câncer. Os efeitos colaterais dependem de quais fármacos são usados. muitos gatos sentem letargia aumentada e apetite diminuído  por um ou dois dias após a quimioterapia, além de vômitos e diarreias.

Os veterinários e proprietários devem trabalhar como uma equipe para combater os sarcomas induzidos por vacinas. Para reduzir os riscos  dos sarcomas os veterinários devem administrar cada vacina em um local separado, quando múltiplas vacinas são necessárias. Para ajudar a assegurar que o tratamento seja bem sucedido, no caso do surgimento de um tumor, é indicado que vacinas que apresentam maiores riscos, como  raiva e leucemia felina, sejam administradas nas patas traseiras. Desta maneira, se um gato for extremamente infeliz e desenvolver o sarcoma, este poderá ser completamente removido pela amputação. Embora inchaço e calor na região da vacina, sejam sinais comuns e positivos após uma vacinação, indicando que o organismo está respondendo ao antígeno aplicado, os proprietários devem alertar seus veterinários, quando algum inchaço duro persistir por mais de um mês após a vacina. Essas medidas simples diminuem os riscos que os gatos morram por sarcoma induzido por vacina, enquanto que asseguram que doenças infecciosas importantes ainda possam ser prevenidas pela vacinação.

Bibliografia:

Ettinger, AJ e Feldman, EC. Tratado de medicina interna veterinária. Doenças do cão e do gato. Quinta edição. Volume 2. Editora Guanabara Koogan. 2008

sábado, 5 de outubro de 2013

Anemia Hemolítica Autoimune (AHAI)


   
 “Minha cadelinha está tristinha, não está querendo comer e parece fraca. De vez em quando ela  abre as perninhas, como se não aguentasse o próprio peso, e cai... Outro dia ela foi fazer xixi e caiu sobre a urina... Não doutor ela nunca teve carrapato”

Ainda não sabemos muito a respeito das reais causas fisiológicas associadas à AHAI. Sabemos apenas que essa doença, que acomete quase que exclusivamente cães (especialmente cadelas), humanos e (menos frequentemente) gatos, é causada por uma resposta imunológica endógena (do próprio animal), contra proteínas específicas presentes na superfície das células vermelhas do sangue (eritrócitos ou hemácias). Por esse motivo, essas células acabam se rompendo dentro dos vasos sanguíneos, resultando no desenvolvimento de uma anemia que pode aparecer de forma grave e aguda, mas que frequentemente se desenvolve mais lentamente apresentando-se de forma crônica.  Quanto mais lento o desenvolvimento, menores são a chances do animal apresentar icterícia (pele amarelada).Todo o processo de desenvolvimento da doença costuma ocorrer em um prazo de varia de dias a semanas.

Clinicamente, o que chama a atenção do proprietário é a apatia repentina do animal, que passa a dormir por períodos mais longos, sinais de fraqueza, perda de apetite e mucosas ictéricas ou pálidas (boca amarela ou branca). Em alguns casos a urina pode estar escurecida, resultado da grande quantidade de hemoglobina liberada na circulação e que é convertida à bilirrubina, especialmente na forma aguda.

Para que possa diagnosticar esse tipo de anemia, o veterinário deve afastar todas as outras possíveis causas de anemia, incluindo erliquiose (doença do carrapato), babesiose, intoxicação por cebola ou outras plantas tóxicas, processo hemorrágicos, grande quantidade de ectoparasitas, endoparasitas hematófagos etc. A avaliação da função hepática é fundamental e, para tanto, devem ser exigida a bioquímica sérica de albumina, ALT, AST e proteínas totais, as quais podem estar normais ou discretamente diminuídas. Uma concentração elevada de bilirrubina pode ser vista nos casos de início mais agudo, onde o organismo ainda não pode compensar a metabolização dessa substância. Nos casos crônicos as bilirrubinas estarão normais.

O hemograma do animal poderá apresentar um quadro anêmico bastante acentuado, com diminuição de todos os valores eritrocitários (contagem total de eritrócitos, hematócrito e hemoglobina). Formas anormais dessas células podem ser observadas, especialmente esferócitos. A avaliação dos  índices hematimétricos (VCM e CHCM) frequentemente indicarão um processo degenerativo. A contagem de neutrófilos pode estar aumentadas, enquanto que a contagem de plaquetas estará reduzida. Isso porque são observadas lesões plaquetárias, semelhantes às observadas nas hemácias. Contudo, o quadro em nada se parece com o presente na erliquiose, onde a trombocitopenia é muito mais acentuada.

Os tratamentos convencionais consistem na utilização de drogas imunossupressoras.
As cinco drogas mais utilizadas são:


  • Prednisona 1-8 mg/kg/dia
  • Dexametasona 0,2-1 mg/kg/dia
  • Azatioprina 1-2,7 mg/kg/dia
  • Ciclosporina 3-8 mg/kg/dia
  • Ciclofosfamida 1,1-3,3 mg/kg/dia


Os tratamentos podem demorar de 4 à 14 dias para surgirem efeito. Em casos graves (hematócrito 10-12%) deve-se considerar uma transfusão (papa de hemácias é melhor do que sangue total), para dar tempo à resposta do organismo ao tratamento. 

Trabalhar com animais que apresentem a AHAI, representa um grande desafio diagnóstico e terapêutico para o médico veterinário, pois a doença apresenta uma taxa de mortalidade que varia de 50 a 70%. 

Bibliografia:


  • J.W. Swann, 
  • B.J. Skelly. 
  • Systematic Review of Evidence Relating to the Treatment of Immune-Mediated Hemolytic Anemia in Dogs. Journal of Veterinary Internal Medicine. Volume 27Issue 1pages 1–9, January/February 2013.


    Kerr, Morag G. Exames Laboratoriais em Medicina Veterinária - Bioquímica Clínica e Hematologia. Segunda Edição. Roca, 2003.
    Bem vindos amigos,

    Meu nome é Bruno, sou médico veterinário, biólogo e professor universitário. Também sou proprietário de uma clínica veterinária, Pet cure - Centro Veterinário (www.petcure.com.br), localizada na zona sul de São Paulo.

    Desde muito antes de me formar em medicina veterinária, sempre tive muita curiosidade a respeito de assuntos relacionados a essa área. Lembro-me que todas as vezes que levava meus cães doentes ao veterinário, uma das primeiras coisas que eu fazia ao retornar para casa, era pesquisar na internet tudo o que o “doutor” havia dito. Queria muito saber se o que eles tinham era grave, se iriam ficar bons logo ou mesmo se a conduta adotada pelo veterinário estava correta. Como nessa época eu ainda era um leigo no assunto, ficava bastante complicado definir se as informações que eu encontrava eram de fato válidas.

    Assim como eu, sei que muitos proprietários costumam fazer isso, e muitas vezes se encontram perdidos, em meio a tantas informações diferentes que podem ser encontradas por ai. Por esse motivo decidi montar esse blog. Aqui poderei apresentar alguns dos casos clínicos mais comuns dentro da clínica veterinária, com os quais alguns de vocês possam vir a se deparar algum dia. A ideia é responder às dúvidas mais frequentes de forma simples e direcionada para o público geral.

    Além disso, também pretendo expor aqui, alguns casos clínicos mais complicados, os quais frequentemente discuto com colegas de profissão. Dessa forma será possível tornar esses debates mais abertos, permitindo a participação e o aprendizado de um maior número de pessoas, em especial, alunos do curso de medicina veterinária.

    Sintam-se a vontade para enviarem perguntas e sugestões de temas para discussão.

    Obrigado pela sua visita!!